dúvida do leitor
A leitora Cláudia Emir Vieira Galante, do Tribunal Superior do Trabalho, envia-nos a seguinte mensagem:
“Gostaria de tirar uma dúvida com o Professor José Maria da Costa. Sempre usei a expressão ‘sob o fundamento de’ com apoio no que diz Napoleão Mendes de Almeida em seu livro ‘Dicionário de Questões Vernáculas’, entrada pelo verbete ‘sob, sobre’, páginas 527 e 528. Depois de fazer algumas considerações, o Prof. Napoleão conclui: ‘Da idéia estática de inferioridade deduziu-se, em latim a nas línguas neolatinas, a idéia de sujeição. Daí o ‘sub conditione’, e o ‘sub poena mortis’. Essa idéia de sujeição é que explica ‘sob palavra’, ‘sob o fundamento de’. Gostaria de saber sua opinião sobre o assunto. Atenciosamente.”
1) Trata-se de expressão defeituosa, porquanto, como lembra Vitório Bergo, “qualquer cousa se levanta sobre o fundamento”,1 e não sob o fundamento.
2) Nesse cochilo, entretanto, incidem usuários de vulto do idioma, como Laudelino Freire, o qual assevera que “a locução conjuntiva enquanto que (enquanto, ao passo que, se bem que) é hoje de uso na linguagem de grandes escritores, cuja autoridade afasta o que contra ela alguns gramáticos sentenciam, sob o fundamento, meramente aparente, de ser ou parecer tradução da expressão francesa tandis que”.2
3) Em verdade, ante o próprio significado da expressão, cujo conteúdo semântico não quer realçar a idéia de sujeição, mas de alicerce sobre o qual alguma coisa se ergue, é que não parece assistir razão ao ensino de Napoleão Mendes de Almeida, quando assevera que “essa idéia de sujeição é que explica ´sob palavra´, ´sob o fundamento de´”.3
4) Quando se diz sob condição, sob pena de morte ou mesmo sob palavra, reside claramente em tais expressões a idéia de sujeição ou mesmo de subordinação. Quando se fala em fundamento, todavia, não há idéia alguma de sujeição ou de subordinação, mas de base, sobre a qual (e não sob a qual) se erige um pensamento ou raciocínio.
Originalmente postado em: Migalhas.